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Danilo Molina: Marina é mais do golpe

Após a divulgação dos números mais recentes da pesquisa Datafolha, do último dia 10, o oligopólio midiático e parte da elite política nacional voltaram a bater bumbo sobre a unidade das forças de direita, que apoiaram o golpe, apontando a candidatura da ex-senadora, Marina Silva (Rede), como alternativa. Tudo porque, em um cenário de eleições em que Lula seja impedido de concorrer, Marina aparece em segundo lugar da pesquisa, com 15% das intenções de voto, contra 19% das preferências do candidato da extrema direita, Jair Bolsonaro.

A principal sinalização de um apoio formal de parte da elite financeira e econômica nacional à candidatura de Marina vem em insinuações do grão-tucano e ex-presidente, Fernando Henrique Cardoso. Frente ao retumbante fracasso que é, até o momento, a candidatura de seu correligionário Geraldo Alckmin, estagnado com 7% das intenções de voto, Fernando Henrique Cardoso articula um movimento, autointitulado suprapartidário, que vislumbra em Marina Silva uma alternativa para viabilizar uma candidatura competitiva pelo campo golpista, que tenta ludibriar a opinião pública, sob a falsa alcunha de “centro democrático”.

Além de Fernando Henrique Cardoso, assinam o manifesto, que dita as diretrizes do movimento, o chanceler Aloysio Nunes, o deputado tucano Marcus Pestana e o senador Cristovam Buarque, entre outros. No documento “Manifesto por um Polo Democrático e Reformista”, todos aqueles que apoiaram o golpe defendem bandeiras como “a busca incansável do equilíbrio fiscal” e a necessidade de uma reforma da previdência.

No fundo, ao que parece, o “Manifesto por um Polo Democrático e Reformista” procura dar um verniz democrático a uma candidatura golpista e a seu projeto de ortodoxia fiscal permanente e de aprofundamento da agenda neoliberal. Nunca é demais lembrar que esse projeto sofreu quatro derrotas consecutivas nas últimas eleições presidenciais e não possui qualquer aprovação popular, como expressam os 82% de entrevistados que avaliaram o governo Temer como ruim ou péssimo.

A aposta desse grupo político para vencer as eleições de outubro é no aprofundamento da chamada “pós-política” e na vitória da crise de representatividade para radicalizar a implementação de uma agenda neoliberal. Como Lula lidera todas as pesquisas e vence qualquer adversário em qualquer cenário, esse grupo trabalha para a realização de eleições sem o ex-presidente, principal liderança e maior representante de um projeto de governo desenvolvimentista, que já provou que é possível combinar soberania nacional, protagonismo internacional, estabilidade, crescimento econômico, democracia e inclusão social com distribuição de renda.

Além do bom desempenho nas pesquisas em uma eleição que excluiu Lula, Marina ainda tenta aparentar, para um segmento da população, ser um nome associado com a antipolítica e com o “novo na política”, apesar de ser uma política profissional com vários mandatos, ainda que menos contaminada pelo desgaste que vem impactando todos os partidos políticos mais estruturados e importantes, desde a deflagração da Operação Lava Jato. Outro fator que pesa em favor da candidata da Rede é o fracasso e a rejeição de que padecem todos os candidatos que tem seus nomes umbilicalmente associados ao desastroso golpe de 2016, que afastou a presidenta Dilma, sem que ela tenha cometido crime de responsabilidade.

Marina possui, ainda, um histórico de vida de superação e um passado de militância na esquerda e na defesa de questões ligadas ao meio ambiente, o que contribui para a formação de uma imagem um pouco mais progressista e palatável da candidata para importantes parcelas da população.

Porém, Marina defendeu publica e abertamente o golpe e pediu que os parlamentares de seu partido votassem a favor do golpe e de todas as suas reformas de arrocho fiscal e de retirada de direitos trabalhistas e sindicais. Não houve fechamento de questão e parte da pequena bancada parlamentar da Rede Sustentabilidade votou contra o golpe, mesmo que em contraposição ao pedido da candidata, o que diluiu, na opinião pública, o apoio explícito de Marina ao golpe.

Acontece que todo esse discurso de ser “o novo na política” e da “ética na política” vai para o ralo quando começar a disputa real, na campanha eleitoral. Não será difícil refrescar a memória dos eleitores, depois de ter sido militante do PT por cerca de três décadas e ministra do governo do presidente Lula por sete anos, do apoio de Maria ao então candidato tucano Aécio Neves, que chegou a lhe pedir benção, no segundo turno das eleições de 2014. Tão pouco será fácil para a candidata se desassociar do golpe e da agenda neoliberal do governo Temer, caso seja ela o fruto de toda essa costura política do “centro democrático”. Marina também terá problemas para se desvencilhar da defesa enfática à independência institucionalizada do Banco Central, que propôs nas últimas eleições em 2014, e de todo seu crescente envolvimento com o mercado financeiro e seus representantes.

Não há como fugir ou como negar a história. Marina Silva mudou radicalmente, rompeu com sua história e com sua militância e apostou contra o pacto democrático da Constituição de 1988, quando apoiou o golpe de 2016. Não podemos deixar de mencionar o compromisso da candidata com a segunda onda neoliberal, quando ela declarou que, caso estivesse no exercício de algum cargo parlamentar, votaria a favor da reforma trabalhista, da Lei de Terceirização irrestrita, da Reforma da Previdência e da perversa ortodoxia fiscal da PEC 95 de congelamento dos gastos públicos por 20 anos, que segundo relatório do Tribunal de Contas da União paralisará o funcionamento da máquina pública já no primeiro semestre de 2024.

O próprio guru econômico de Marina, Eduardo Giannetti, declarou recentemente para o jornal El País que Temer tinha um bom plano de governo. O economista de Marina escancara o compromisso da candidata com o mercado financeiro, ao afirmar, sobre o governo Temer, que “do ponto de vista econômico, foi um alívio ter uma boa equipe econômica, uma mudança para melhor na governança das estatais e ter um programa de reformas, que no geral é bem correto, a Ponte para o Futuro, que coloca uma agenda de mudanças para que o país volte a recuperar o crescimento e a sustentabilidade das contas públicas”. A boa governança das estatais seguramente é o desastre econômico e social de Pedro Parente e de sua política de financeirização da Petrobrás e dos preços dos combustíveis.

Por todos esses aspectos, a candidatura de Marina se caracteriza como uma agenda de continuísmo da política econômica de ajuste neoliberal e de ortodoxia fiscal golpista, entreguista e que aprofunda as desigualdades sociais do país. A candidatura de Marina não representa, em nada, a proposição de uma agenda desenvolvimentista e democrática. Por isso, está sustentada no tapetão de uma disputa eleitoral sem Lula, como a própria candidata vem defendendo publicamente.

Não adianta o deputado Miro Teixeira, apoiador de Marina, fazer jogo duplo e declarar que “não se pode falsificar uma candidatura. Uma candidatura da Marina é assim. Se quiser rotulá-la de direita, você pode. Se quiser vê-la como esquerda, também pode”. Uma candidatura se constrói com fatos e os fatos revelam que, hoje, Marina é uma candidata da direita, dos golpistas e da elite financeira e econômica.

Não à toa, o grupo político ligado à Fernando Henrique Cardoso tem dito que Marina Silva seria uma excelente vice em uma chapa encabeçada pelo tucano Geraldo Alckmin ou vice-versa. Aquela militante política, ativista social das causas dos povos da floresta, que caminhava ao lado de Chico Mendes, deu lugar à um projeto de poder que caminha de mãos dadas com os barões do capital financeiro da Avenida Paulista.

O grande problema de toda essa estratégia da direita para ludibriar o povo brasileiro, ao apostar em uma candidatura golpista revestida de ares democráticos e de antipolítica, é que de uma eleição sem Lula emergirá um governo sem legitimidade e sem respaldo popular, como já é o governo Temer. Prova disso é que, sem Lula, 33% dos eleitores declaram não votar em nenhum outro candidato.

Por isso, uma eleição democrática e legítima exige que Lula tenha o direito de ser candidato e que o povo possa escolher com liberdade e soberania o futuro do país. Assim, não só Marina, como quaisquer outras forças ou lideranças políticas, poderão provar que estão corretos, ao tentar derrotar Lula nas urnas. Entretanto, a realidade que se apresenta até agora não é essa. Mesmo depois de mais de dois meses de uma injusta prisão, Lula continua nos braços e nos corações do povo brasileiro, liderando todos os cenários da corrida presidencial de outubro próximo.

 

Danilo Molina – Jornalista, foi assessor do Ministério da Educação e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) durante o governo Dilma Rousseff e servidor do Ministério durante o governo Lula

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